Francisco de Sá de Miranda nasceu em Coimbra, entre 1481-1485, e morreu no Minho, em 1558, numa quinta à qual se recolheu para afastar-se da vida da corte. É considerado um dos maiores poetas do século XVI (o século de ouro da poesia portuguesa). Tendo vivido cinco anos em Itália, Sá de Miranda foi o principal introdutor em Portugal das novas formas poéticas do Renascimento, a que se convencionou chamar “medida nova” (isto é, uma medida poética mais exigente, introduzindo o decassílabo, que se conjuga com uma maior complexidade dos conteúdos), em contraste com as formas poéticas tradicionais da Península Ibérica (que a partir de então se passaram a designar “medida velha”). Tendo influenciado os demais poetas portugueses, que progressivamente foram adoptando as novas formas poéticas, Sá de Miranda não abandonou por completo, no entanto, a tradição poética peninsular: assim, da sua produção constam, por exemplo, sonetos e éclogas em medida nova (seguindo a lição do dolce stil nuovo italiano) e vilancetes e cantigas em metro tradicional.
No soneto apresentado, um dos mais belos do poeta, o poeta trata o tema da mudança, observando as transições na natureza e comparando-as consigo mesmo (“também mudando-m’eu fiz doutras cores”), verificando que não possui no entanto a mesma capacidade de renovação.
O sol é grande, caem co’a calma as aves,
do tempo em tal sazão, que sói ser fria;
esta água que d’alto cai acordar-m’-ia
do sono não, mas de cuidados graves.
Ó cousas, todas vãs, todas mudaves,
qual é tal coração qu’em vós confia?
Passam os tempos vai dia trás dia,
incertos muito mais que ao vento as naves.
Eu vira já aqui sombras, vira flores,
vi tantas águas, vi tanta verdura,
as aves todas cantavam d’amores.
Tudo é seco e mudo; e, de mestura,
Também mudando-m’eu fiz doutras cores:
E tudo o mais renova, isto é sem cura!
VOCABULÁRIO
sazão – estação; sói (verbo soer) – costuma; cuidados – pensamentos, preocupações.
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